domingo, 15 de fevereiro de 2009

The Dresser (1983)



IMDB

Durante a 2ª Guerra Mundial vive um idoso (Albert Finney), mas famoso ator shakespeariano, que agora está frustrado, senil e à beira de uma crise nervosa. É conhecido pelo elenco e equipe apenas como "Sir" e continua sua temporada pelos teatros britânicos com um grupo de velhos atores, que ficaram isentos do serviço militar. Sir exerce uma tirânica liderança na companhia, que começa a desmoronar em virtude da sua idade e seu estado de saúde. Ele conta com Norman (Tom Courtenay), seu camareiro, um homossexual infinitamente fiel que tem uma dedicação tão extrema e até irritadiça. No momento estão encenando "Rei Lear" e Norman inclina-se às exigências por vezes absurdas de seu patrão, cuida de sua saúde e procura lembrá-lo do papel que está encenando, já que às vezes Sir se confunde. Em suma, Norman faz qualquer coisa para este homem que ele aprendeu a amar e a respeitar, sendo que há uma forte ligação entre eles, pois apesar de não ser conhecido como seu patrão ambos devotaram suas vidas ao teatro.

"Lembram quando falei de aula de interpretação em Uma Rua Chamada Pecado ...Pois bem aqui vai a segunda parte da aula....simplesmente EXCEPCIONAL , se vcs assitirem um filme depois o outro ..pronto vocês estarão aptos a pisar no palco...rsrsrsr , filme completamente coração , dei boas gargalhadas (muitas mesmo), me emocionei , fiquei apreensivo e tudo o que eles podiam tirar de mim conseguiram. Mais uma vez obrigado ao compartilhamento por me dar momentos tão significativos em um final de semana que poderia passar como outro qualquer."

Crítica

Assistindo "O Fiel Camareiro", o espectador mais (bem) informado não deixa de se irritar com a Academia de Artes e Ciências Cinematográficas de Hollywood: como é que o Oscar não foi concedido a nenhum dos dois atores principais desta fita magnífica, indicados à estatueta, Tom Courtnay e Albert Finney? Ainda mais considerando-se que o ator que acabou sendo premiado, Robert Duvall, dificilmente será apreciado por sua interpretação: "Tender Mercies", o filme em que atuou devido à sua temática regional (os problemas de um cantor country americano) não está previsto para exibição comercial no Brasil.
Assim como "O Despertar de Rita"- que valeu a Michael Caine também indicação ao Oscar de melhor ator - este "The Dresser" tem origem teatral. Foi adaptado para a tela pelo próprio autor, Ronald Harwood (igualmente indicado ao Oscar, perdeu para James L. Brooks, de "Laços de Ternura"). A peça fez carreira em Londres e Nova Iorque e nos devolve um universo já visto em muitas obras cinematográficas e teatrais: os bastidores do teatro. No próprio núcleo em que se cria e vivem emoções, transcorre o profundo drama do velho ator shakesperiano, Sir (Albert Finney) e seu camareiro, Norman (Courtnay).
Um dos mais brilhantes críticos brasileiros, Rubem Ewald Filho, lembrou com precisão ("O Estado de São Paulo", 22/6/84), que "O Fiel Camareiro" é um filme especialmente "destinado" a quem gosta de teatro, fazendo recordar "A noite Americana", de Truffaut. Aquele filme era uma espécie de carta de amor ao cinema. Aqui, o amor é declarado ao teatro, ao fascinante mundo do palco, com sua mitologia, sua leis próprias, seus personagens inesquecíveis".
O autor da peça, o inglês Ronald Harwood, foi camareiro do ator Sir Donald Wollfit, nos anos 50. Assim, tudo o que descreve parte de sua própria experiência. Harwood nos remete a um tempo e a um tipo de teatro que não existe mais. Era uma tradição na Inglaterra as excursões pelo interior com peças shakespearianas estreladas por atores veteranos e consagrados, que adaptavam os textos à sua própria personalidade.
Entretanto, "O Fiel Camareiro" não é apenas um filme de teatro. É uma dolorosa reflexão sobre a velhice, sobre o final da carreira de um marcante ator, mas que está velho e decadente. A velhice não veio acompanhada de uma previsível humildade, e ele continua conhecido apenas por Sir - título que dispensa maiores explicações para justificar seus inevitáveis arroubos de autoridade. O mesmo poder capaz de fascinar durante décadas o público ávido por tragédias shakespeareanas, Sir exerce tiranicamente dos bastidores e não hesita extrapolar para fora os domínios. Afinal, não será um simples maquinista com mania de pontualidade que ousará contrariar os desejos do Sir. Assim, na primeira (e uma das únicas) seqüência exterior, ao longo de uma estação ferroviária, um incontestável "Stop that train" (pare o trem) ecoa pela gare. Como observou Susana Schild, "está fixado o modelo do comportamento de Sir em um dos melhores momentos de ‘O Fiel Camareiro’ ".
Pela sua própria origem teatral, "The Dresser" é um filme de interiores - o camarim e o palco, onde se representa "Rei Lear", de Shakespeare. A câmera utiliza bastante o recurso do close e primeiros planos, para demonstrar a velhice do personagem, a angústia de seu camareiro Norman, quando o velho ator esquece as falas do texto shakespereano. O público passa a exercer uma espécie de torcida para que a peça chegue ao fim.
É um filme belo, lindo! Emocionante a todos que sabem ver a arte e a vida, numa obra marcante e interpretações antológicas. Finney e Courtneay mereceriam um prêmio especial (concorreu também ao melhor filme e direção, perdendo para "Laços de Ternura"). Os coadjuvantes compõe com perfeição o retrato dos bastidores: a jovem ambiciosa, a diretora de cena apaixonada pelo ator, o Iago tão eficiente que provoca ciúme. Finney, apenas 47 anos, interpreta o setuagenário "Sir" para simbolizar a submissão de um pobre mortal a um monstro sagrado. Courtnay criou um afeminado e aparentemente frágil e submisso Norman que desenvolve porém um personagem fortíssimo, que conhece a fundo o Sir, suas manias e fraquezas. Sabe que ele está física e emocionalmente acabado, que mal agüenta subir ao palco e com enorme dificuldade lembra-se dos textos que repetiu 227 vezes. Mas assim como Sir, Norman tem o teatro nas veias e conseguir que Sir represente mais uma vez é desafio que enfrenta como se sua própria carreira estivesse em jogo. E no fundo está, como precisamente lembrou Susana Schild nas páginas do "Jornal do Brasil” (22/6/84).

Texto de Aramis Millarch, publicado originalmente em:
Veiculo: Estado do Paraná
Caderno ou Suplemento: Nenhum
Coluna ou Seção: Tablóide
Data: 26/08/1984


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